sábado, 25 de agosto de 2012

Guerra da Sucessão

Guerra da Sucessão
20:21 por António Pedro Barreiro

Nos últimos meses, à medida que cada acto eleitoral trazia uma derrota cada vez mais espalhafatosa para o Bloco de Esquerda, muitos especulavam acerca da saída de Louçã. Após treze anos à frente do partido, parecia consensual que a liderança de Louçã era uma das principais causas dos tímidos resultados do Bloco. Gil Garcia disse-o, Daniel Oliveira reiterou-o, Miguel Portas confirmou-o. Esta realidade parecia óbvia para todos, excepto para o próprio Louçã que, apesar de admitir invariavelmente as estrondosas derrotas do partido, nunca retirou delas as ilações necessárias. Foi assim quando o Bloco perdeu as vereações em Lisboa e no Porto, foi assim quando o Bloco foi extirpado de metade do seu grupo parlamentar e foi até assim quando o Bloco foi corrido da Assembleia Legislativa da Madeira: Louçã via o castelo a desmoronar-se, mas parecia continuar a achar-se o único capaz de o reconstruir ou, pelo menos, demasiado orgulhoso para admitir que a derrocada era culpa sua. E, deste modo, o Bloco parecia esgotar-se em Louçã: no autismo de Louçã, na soberba de Louçã, no calculismo político de Louçã.
Foi então que, no passado dia 17 de Agosto, o coordenador do BE disse o que muitos ansiavam por ouvir, numa carta endereçada ao cada vez mais diminuto "povo do Bloco". Depois de treze anos à frente do partido, cinco candidaturas a Primeiro-Ministro e uma candidatura a Presidente da República, Louçã vai mesmo abandonar o barco. A tão antecipada saída não vai, é claro, coincidir com um período pós-eleitoral, para poupar o ainda líder da extrema-esquerda à humilhação de se assumir responsável por mais uma derrota. Louçã sabe que tem de sair, mas, podendo fazê-lo de mansinho, prefere.
Mas Louçã não quer só abandonar o barco de mansinho. Quer poder também escolher o timoneiro. Ou melhor, os timoneiros. Afinal, Louçã sempre soube gerir os destinos do partido melhor do que os militantes...
Louçã com João Semedo, um dos líderes que escolheu para o Bloco.

Louçã sabe que o seu tempo chegou ao fim e sabe que o Bloco precisa de uma renovação, sob pena de se esgotar. E foi por isso que propôs que a direcção do partido fosse assumida por João Semedo e Catarina Martins que, com respectivamente 61 e 39 anos, encaixam no ideal de sangue novo de que o Bloco tão desesperadamente necessita.
Louçã compreende isto melhor do que ninguém, assim como compreende que este novo modelo de direcção responde aos desafios do século XXI. Curioso timing o deste líder que coordena o partido desde 1999 e só na iminência da sua queda se apercebe que passou doze anos agarrado a um modelo de direcção que é apanágio do século passado.
Agora, falta saber se as hierarquias do BE vão cumprir a última vontade de Louçã ou se vão deixar os militantes do Bloco escolher a sua liderança livremente, como falta saber se o fantasma de Louçã vai continuar a assombrar o Bloco, mesmo depois da saída do coordenador.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Do Corte na Despesa

Do Corte na Despesa
03:54 por António Pedro Barreiro

A 21 de Agosto do ano passado, tomava posse o actual Governo Português. Depositário de uma nefasta herança de endividamento irresponsável, incompetência na gestão do dinheiro dos contribuintes e crescimento económico negativo e limitado pelo memorando que os socialistas negociaram, aprovaram e propagandearam em nome de Portugal, o recém-empossado Executivo assumiu-se como reforminsta, enérgico e corajoso no diagnóstico e resolução dos problemas de despesismo e endividamento excessivos que afectavam o Estado português. Bastaram algumas semanas para que se verificasse que a tarefa a que o Executivo se propunha iria ser ainda mais difícil de cumprir do que parecia, à medida que se percebia a verdadeira dimensão do desbarato em que o PS deixara as contas públicas, que se revelava a extensão dos buracos da Madeira e que era exigido ao Governo que pagasse as facturas das empresas públicas.

Contudo, e não obstante o clima adverso que enfrentava, o Executivo deitou mãos à obra e começou a cortar na despesa: o número de Ministérios foi reduzido, os Governos Civis foram extintos, o Ministério dos Negócios Estrangeiros eliminou 21% dos cargos dirigentes, o MAMAOT reduziu-os em 25% e o Ministério da Justiça em 33%, o Ministério da Educação substituiu as Direcções Regionais por estruturas simplificadas e o Ministério da Solidariedade Social não renomeou os directores-adjuntos distritais. Para além destas decisões, a orgânica do Governo foi simplificada, com o Ministério da Justiça a extinguir 21% das suas estruturas orgânicas e o MAMAOT a eliminar 25 unidades de gestão.
Os cépticos ignoraram estas mudanças. Na sua visão tacanha, estas não passavam de uma operação cosmética para disfarçar um lúgubre lodaçal de compadrio e corrupção em que, por exemplo, os gestores públicos continuavam a fazer fortunas. Porém, o Executivo não ficou por aqui. Decidiu responsabilizar criminalmente os dirigentes que autorizassem notas de encomenda não cabimentadas e alterar o estatuto dos gestores públicos eliminando os prémios de gestão e os cartões de crédito das empresas, introduzindo a possibilidade de despedimento e limitando os ordenados ao montante ganho pelo Primeiro-Ministro e o número de administradores de cada empresa a três, seleccionados por uma entidade independente.
Mais uma vez, os cépticos fizeram vista grossa, sorriram cinicamente e continuaram a afirmar que o Governo  apenas arranhara a superfície dos problemas. Chegar ao cerne destes não era, segundo os cépticos, um objectivo do Executivo. Daí que ainda proliferassem institutos públicos, empresas públicas e empresas municipais que ninguém estava interessado em extinguir. Mas o Governo provou, uma vez mais, que assim não era: proibiu a criação de novas empresas municipais, legislou para que as Autarquias tivessem de as reduzir em 50%, eliminou a Parque EXPO, fundiu o IPJ com o Instituto do Desporto e, posteriormente, de uma assentada só, extinguiu 146 organismos públicos e 290 cargos de direção superior. Acabou, também, por fim, com o encargo que o BPN representava para os contribuintes, privatizando-o e negociou com mestria a privatização da parte pública da EDP, algo que não fazia sentido manter após a abolição das golden shares. Reduziu ainda em 15% as transferências para a RTP.
Todavia, havia quem continuasse pouco convencido. Se os cépticos estavam mais à direita no espectro político, tendiam a acusar o Governo de complacência para com a proliferação de fundações. Se estivessem mais à Esquerda, o cerne dos problemas estava nas parcerias público-privadas. Uma vez mais, o Governo deu resposta a estas situações. Em Janeiro deste ano, lançou o censo às fundações, uma auditoria a estas organizações que, publicado hoje, expõe pela primeira vez na História da Democracia os sorvedouros que estas instituições têm sido. Hoje mesmo, após a publicação dos resultados, o Executivo anunciou que iria cortar o financiamento a estas organizações em 50% e, em muitos casos, em 100%. Também hoje, foi anunciada a renegociação dos acordos de concessão rodoviária, as tais PPP com que a Extrema-Esquerda tanto enchia a boca, que permitirão ao Estado poupar mais de mil milhões de euros.
A verdade é que, depois do descalabro socialista, este Governo e esta maioria têm estado a atacar de forma metódica, reformista e corajosa a despesa pública, o sobre-endividamento do Estado e os interesses instalados. E não é o cepticismo de alguns Velhos do Restelo que vai mudar isso.