sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Indignidades

Indignidades
17:44 por António Pedro Barreiro

Leopoldo López foi, até Fevereiro de 2014, um dos principais dirigentes da oposição democrática venezuelana. Enquanto participava numa manifestação pacífica, foi detido sob acusações forjadas. Esteve preso mais de um ano sem que qualquer julgamento tivesse lugar. Sem direito a receber familiares. Sem acesso a serviços religiosos da sua Fé. Em Setembro deste ano, foi condenado a mais treze anos de encarceramento, sob os protestos da Amnistia Internacional.


López é, em tudo, um preso político. Como ele, há dezenas na Venezuela. Como Geraldín Moreno, uma estudante baleada pela polícia durante uma manifestação pacífica. Como Marvinia Jímenez, detida por filmar um caso de brutalidade policial. Como John Fernández, de apenas 16 anos, cegado por uma bala de borracha. Como Rosmit Mantilla, encarcerada por defender os direitos humanos. Como Maria Corina Machado, suspensa do seu mandato parlamentar. Como Daniel Quintero, imolado pelo fogo sob a custódia das forças policiais venezuelanas. 

Luaty Beirão merece a nossa solidariedade. Leopoldo López também. Nenhum dos dois merece a indignidade de ser invocado por um partido - o Bloco de Esquerda - que lamentou a morte de Hugo Chávez, saudando-o porque, "enquanto que na Europa a democracia está a falhar, na Venezuela a democracia participativa tornou-se num sinal de identidade" (sic). Não há democracia onde há prisões arbitrárias e assassinatos discricionários. Não há presos políticos de primeira e de segunda. Não há honra no oportunismo do Bloco de Esquerda. Não haverá perdão para o nosso silêncio.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

O vídeo de Costa: as razões de um acto

O vídeo de Costa: as razões de um acto
02:17 por António Pedro Barreiro

Publicado no Observador

Chamo-me António Pedro Barreiro e tenho 19 anos. No sábado passado, percorri a videografia do PS e lancei nas redes sociais um excerto de um discurso de 2009, em que António Costa rejeitava arranjos governativos sem a candidatura mais votada. Não agi por encomenda, nem por acaso. Agi por convicção e as convicções, necessariamente, explicam-se. Faço parte de uma geração nascida depois de Abril. Nasci liberto das mordaças do regime deposto e dos humores expropriantes do PREC. Conheci Portugal, velho de nove séculos, dentro de uma Europa livre e inteira. Cresci sobre os destroços do Muro que fez tombar todos os muros. Sou livre e só conheci a liberdade. Sinto-me ocidental e europeu e é nesses cenários que vivo a minha portugalidade. Claro que a recessão e a austeridade enegreceram este quadro. Como todos os portugueses, senti os cortes em casa e vi-os chegar às casas vizinhas. Porém, mesmo no pico dos sacrifícios, não tive – não tivemos – de temer limitações aos levantamentos bancários, nem desvalorizações abruptas da moeda, nem surtos inflacionários súbitos, nem crises nos abastecimentos. O nosso estatuto de Nação ocidental e europeia, defendido por um consenso transpartidário com quatro décadas, não estava em causa. Para alguns, seria uma mão cheia de nada. Para a Geração Erasmus, era um suplemento de resiliência: sentir que o regime que não vimos nascer também tinha nascido para nós. Oakeshott gostava de definir a política como “um diálogo entre presente, passado e futuro.” Quando equaciona, por radicalismo ideológico ou calculismo político, abrir as comportas da governabilidade aos aluviões da esquerda radical, António Costa arrisca fazer titubear a frágil retoma económica do presente e esboroar o arco da governabilidade que os seus antecessores mais responsáveis ajudaram a talhar no passado. Porém, e sobretudo, permite que se rasguem fendas no amplo acordo político que forjou a nossa identidade ocidental e europeia. O secretário-geral do PS, partido que sempre se reclamou depositário da liberdade e do sonho europeu, aproxima-se agora dos adversários naturais e assumidos desses conceitos. A minha geração, nascida na Europa e em liberdade, desconfia dessas manobras. E isso explica o acto da publicação e os milhares de actos de partilha que o ampliaram. Há um grande simbolismo em esgrimir o melhor das novas tecnologias contra o pior da velha política. Se António Costa não ouviu os portugueses que votaram esmagadoramente contra a esquerda radical, deverá ouvir-se a si próprio em diferido e perceber o óbvio. Todos os que projectamos na propriedade o reconhecimento meritório do trabalho humano temos o dever de recusar o Governo aos prosélitos das nacionalizações. Todos os que acreditamos na mobilidade social estamos obrigados a opor-nos a quem faz guerra à liberdade de escolha na educação e na segurança social. Todos os que sentimos cair sobre nós as cinzas de um quarteirão nova-iorquino devemos barrar o caminho aos adversários do Ocidente e da NATO. Todos os que experimentámos o peso dos sacrifícios sentimos a obrigação de não os tornar irrelevantes. Todos os que prezamos o pluralismo político, independentemente do nosso sentido de voto, somos chamados a defendê-lo.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Portugal à Frente

Portugal à Frente
18:31 por António Pedro Barreiro

De todas as eleições em Portugal se tem dito que são as mais decisivas da década. Desta vez, o cliché é verdade. A coligação de centro-direita que agora pretende renovar a sua maioria foi a primeira na nossa democracia a terminar o mandato. Mérito de dois líderes partidários que souberam – e nem sempre foi fácil – acertar agulhas e pôr Portugal à frente. Num país onde a despesa pública baixou e o défice cumpre as regras europeias, a economia cresce, o emprego sobe, as exportações batem recordes e os sectores produtivos estão mais robustos. Ou seja, provou-se que não era preciso engordar o Estado para que a economia crescesse. Há sempre espaço para argumentar que a coligação poderia ter feito mais. Fez mais do que qualquer outro governo e deixa, indiscutivelmente, o país melhor do que o encontrou.

António Costa tem corrido contra esta realidade. Quando começou a campanha a acusar a coligação de ter chamado a troika, deixou meio país a rir. A outra metade ficou presa aos factos por detrás da insinuação: o PS ainda não fez a catarse do seu passado, continua orgulhoso dos anos Sócrates e, se brindado com uma oportunidade de regressar ao poder, reciclará as velhas ideias e as velhas oligarquias que comandaram Portugal entre 2005 e 2011. Afinal, António Costa fez meio mandato – consta que, em quase trinta anos de carreira política, nunca acabou nenhum – como testa-de-ferro de Sócrates. Respaldou os timoneiros da bancarrota e, desde que aliviou o seu antecessor da liderança do partido, tem-se entretido a duvidar de todas as estatísticas positivas, a celebrar todas as estatísticas negativas e a bloquear qualquer hipótese de consenso com a maioria.



Durante décadas, os socialistas orgulharam-se de estar na vanguarda do projecto europeu. Portugal entrou na CEE com Mário Soares, ingressou no euro com Guterres e forjou o Tratado de Lisboa com Sócrates. António Costa reclama-se herdeiro desse legado, mas não quer cumprir as regras europeias. Entre a Europa e o endividamento galopante, escolhe o segundo. E qualquer eleitor moderado escolhe desconfiar dessa opção. Sobretudo, quando o líder do PS recusa entendimentos com o centro-direita, mas parece ansioso por arranjinhos com a extrema-esquerda, que põem em causa a estabilidade política, a credibilidade internacional do país e, em limite, a pertença à União. Sobretudo, quando António Costa enche a boca com elogios ao Estado Social, mas apoiou os governos que o atacaram até à medula, afogando-o em dívidas.

O PS perderá as eleições de domingo porque, ao contrário dos portugueses, não aprendeu nada com a bancarrota. Quanto mais António Costa quiser relembrar os portugueses dos sacrifícios por que passaram nestes quatro anos, mais depressa as pessoas fugirão das promessas mirabolantes que trazem as bancarrotas e tornam os sacrifícios inevitáveis. É preciso que todos nos mobilizemos para defender o que conquistámos juntos. Quando Portugal já recuperou o direito a sonhar, desenhemos um futuro em que a sociedade e o Estado não se confundam, o berço não determine o sucesso e a prosperidade chegue a todos. Onde não se ganhem eleições à custa das gerações que ainda não nasceram. É preciso pôr Portugal à frente.