Não e segredo para ninguém que vivemos numa época em que grande parte dos cidadãos nutre uma considerável desconfiança acerca da democracia.
Responsável pelas elevadas taxas de abstenção, este sentimento generalizado manifesta-se, entre outras coisas, na proliferação de uma cultura que acredita na inutilidade dos mecanismos da democracia face ao poder dos partidos políticos, concebidos como uma oligarquia especializada na manipulação dos mecanismos supracitados para a satisfação dos seus interesses e para a perpetuação dos seus jogos políticos.
Perante a proliferação deste sentimento generalizado, é obrigação dos partidos políticos exibir um comportamento responsável que permita refutar estes estereótipos. Aos partidos, exige-se, nomeadamente, que recorram com parcimónia aos instrumentos que a democracia lhes proporciona, a fim de não os despojar do seu significado e importância por via da banalização.
A apresentação, nesta segunda-feira, de uma moção de censura pelo PCP não é, obviamente, condicente com este propósito. Para já, porque o PCP não tinha a menor esperança de aprovar esta moção até porque a defendeu advogando os seus dogmas costumeiros ao invés de enveredar por uma retórica supra-partidária que convencesse os socialistas. Depois, porque os marxistas da nossa praça não apresentaram qualquer argumento novo que sustentasse a sua tese, preferindo recorrer à mesma retórica que foi sucessivamente sufragada e recusada durante mais de 30 anos.
Depois de, durante mais de 30 anos, os sindicatos ligados ao PCP terem despojado as greves do seu impacto, fazendo delas parte da rotina dos portugueses, o próprio PCP está a contribuir para a banalização de um instrumento da democracia e a pervertê-lo, a fim de favorecer os seus interesses partidários de um modo populista, demagógico, eticamente errado e, espero, ineficaz.